117 - Longevos e não idosos!
Já falei várias vezes de idadismo, tanto externo – o da sociedade – como interno – o que exercemos sobre nós mesmos. Não me irei, pois, repetir, darei apenas mais um exemplo de como continua a ser visto como algo normal e não discriminatório: a nossa Constituição!
Sim, a última revisão, de 2005, cita 11 situações de violação do “Principio de Igualdade”: ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social, orientação sexual. Pois, engloba, aparentemente, tudo e mais alguma coisa... exceto a idade!
Mas a verdadeira razão do título deste post vem da constatação de que, numa sociedade em que passamos a vida a ouvir dizer que “as palavras contam” e em que não se pode dizer isto e aquilo porque pode ofender, o termo idoso continua a ser comummente usado, apesar das muitas conotações negativas que tem, nomeadamente, o facto de serem os ditos vistos como incapazes para qualquer atividade produtiva, pior ainda, como um fardo para a restante população.
Daí eu achar que se deva substituir idoso por longevo e envelhecimento da população por longevidade da população. Pode parecer uma coisa menor, sobretudo face à definição “oficial” dessas palavras, mas o termo longevidade tem, agora, conotações bem mais positivas, está associado a uma vida plena e feliz. Ou seja, longevidade é, apenas, a constatação de que passamos cada vez mais tempo na chamada “idade avançada”
Basicamente – e como já o disse por diversas vezes – continuamos a associar o termo envelhecimento ao mesmo estereótipo de há séculos, sem vermos que o grande impacto da longevidade é, precisamente, atrasar a velhice. Mais ainda, enquanto o envelhecimento está ligado à chamada disrupção demográfica – uma percentagem cada vez maior de idosos na população – o fator de disrupção associado à longevidade está no facto de não nos sentirmos com a idade biológica que temos.
O que nos leva a um novo conceito, a idade prospetiva ou remanescente: esta é determinada pelo número de anos que é expectável vivermos ainda. Como exemplo, os 65 anos de 1960 correspondem, agora, a 72! Grande azar para quem quer reduzir a idade da reforma... E não é uma mera teoria, estudos mostram cada vez mais pessoas com uma idade avançada e que têm biomarcadores correspondentes a uma bem mais baixa.
Mas há mais. A categoria etária “idosos” engloba, atualmente, as pessoas com 65 aos ou mais, um valor já usado nos anos 40. Só que a sociedade mudou imenso desde então e as pessoas também, sobretudo em termos de esperança média de vida e saúde.
E se queremos alterar o modo como a sociedade vê essa fatia cada vez maior da população e, acima de tudo, o modo como nós, os abrangidos, nos vemos, temos de começar a pôr em prática o chamado envelhecimento ativo, definido como “o processo de otimização das oportunidades para a saúde, participação e segurança, para a melhoria da qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem bem como o processo de desenvolvimento e manutenção da capacidade funcional, que contribui para o bem-estar das pessoas idosas, sendo a capacidade funcional o resultado da interação das capacidades intrínsecas da pessoa (físicas e mentais) com o meio” (World Health Organization, 2015).
Em termos práticos e pessoais, engloba medidas que todos podemos tomar para garantir – ou, pelo menos, aumentar as probabilidades – de chegar até bem tarde em plena forma física e mental. Já falei deles em posts anteriores, relembro, apenas, aqui os principais: atividade física (exercício), alimentação saudável, exercitar a mente, dormir bem, cortar nos vícios. E, também, reduzir o stress e arranjar momentos de lazer e de prazer.
Apesar de se estar sempre a tempo de adotar medidas nestas áreas, o ideal será começar por volta dos 50 anos – ou mais cedo, claro. Mas se já os deixou há muito para trás, “vale mais tarde do que nunca” é um ditado que também se aplica, e bem, aqui.
Um fator importantíssimo para sermos longevos e não idosos está no envolvimento social, que pode ser na família ou na sociedade em geral, com voluntariado, por exemplo, para combater a tão temida e prevalecente solidão de que muitos padecem atualmente e que os impede de viverem plenamente a sua longevidade.
Um outro fator, também ele muito importante, está no emprego, ou seja, deve-se trabalhar mais tempo. Atenção, isto não significa, necessariamente, continuar a fazer o que se fazia, a menos que se queira – já agora, como também já tenho referido, seria bom que a reforma passasse a depender, não apenas da idade, mas também da vontade e capacidades da pessoa em questão. Isto passa por alterar as práticas laborais, para que os longevos se possam manter ativos, mesmo os que têm alguns problemas de saúde.
Muitas sociedades já adotaram medidas nesse sentido, revalorizando a experiência e capacidade de adaptação dos seus elementos de idade mais avançada, em vez de desperdiçarem, como é mais usual, o tremendo capital humano da chamada terceira idade. Mais ainda, começa a ser cada vez mais normal em alguns países vermos pessoas a mudarem de profissão aos 70 anos ou a criarem um negócio aos 80, uma prática que devia ser encorajada.
Um último fator para a longevidade é manter a independência o máximo de tempo possível. Sim, isso passa por haver pensões que permitam ter uma vida condigna, mas, na minha opinião, o seu maior impulsionador será uma mudança de mentalidades, sobretudo as de quem vai para novo, para que deixem de se sentirem inúteis ao ultrapassarem a temida barreira dos 65 anos.
Ao contrário da velhice, a longevidade deverá, pois, ser um período desejável, o que implica rever leis laborais e pensões, promover o envolvimento social, melhorar o acesso a cuidados de saúde, sobretudo preventivos, e criar ambientes e uma sociedade que permitam a sua boa vivência.
Ou seja, fora como o “idoso” – e, sobretudo o “velhinho, coitadinho” – e viva o “longevo”!
Para a semana: Obstipação. Ou a comezinha prisão de ventre, muito usual em quem vai para novo