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Ir para novo

Considerações gerais, ideias, projetos e muito mais para quem está a "ir para novo". E para quem tem em casa alguém avançado nesta viagem. Todos os domingos. Alternarei posts gerais e específicos.

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Considerações gerais, ideias, projetos e muito mais para quem está a "ir para novo". E para quem tem em casa alguém avançado nesta viagem. Todos os domingos. Alternarei posts gerais e específicos.

112 - A propósito dos incêndios

Face à terrível tragédia recente dos incêndios florestais que grassaram por uma boa parte do país, mais uma vez, diga-se de passagem, decidi adiar o tema programado para esta semana para falar um pouco de algumas vertentes mais viradas para quem vai para novo ou, mais especificamente, quem já está bem avançado nessa viagem.

Como vimos as muitas reportagens transmitidas do terreno, várias pessoas perderam o seu modo de vida ou até tudo o que possuíam, só não havendo mais casos graças aos corajosos esforços dos bombeiros e, sobretudo, de muitos populares que, sem a menor formação nessa área ou equipamento de qualquer tipo, fizeram o que podiam para salvar as suas casas e bens. Fiz um post mais genérico sobre este assunto no meu outro blogue, em Voltemos aos incêndios (infelizmente). Mas, como referi no início, irei aqui tratar deste tema sob um outro prisma.

É realmente trágico haver tanta gente que perdeu os seus bens e o seu modo de vida – muitas vezes, foram “só” as suas propriedades agrícolas, animais, oficinas, anexos, ficando apenas a habitação graças, repito, aos seus próprios esforços em muitos casos. Mas é duplamente trágico quando acontece a alguém já com bastante idade.

Passo a explicar.

Jornalistas, comentadores, políticos, ouvimos repetidamente falar em apoios para a reconstrução – bom, espero que corra bem melhor do que em Pedrógão e em inúmeros outros incêndios... E não tenho dúvidas de que, mais tarde ou mais cedo, melhor ou pior, as casas perdidas serão reconstruídas. Só que, quando falamos em reconstruir referimo-nos, apenas, à parte material.

Ou seja, surgirá uma nova casa, possivelmente melhor do que a que ficou destruída, com novos móveis e apetrechos, as pessoas receberão bens pessoais para substituírem os que perderam, enfim, ficarão, aparentemente, tão bem ou melhor do que antes. Mas há coisas que é impossível reconstruir ou substituir e isso pode ser uma tragédia para quem não é novo e se vê nessa situação.

Quando se constrói uma barragem que vai alagar uma povoação ou algumas casas, nunca vos intrigou ver a tremenda renitência de habitantes idosos em trocarem a sua casa, muitas vezes em mau estado, por uma novinha em folha, com um bom quintal e jardim, eletrodomésticos novos, enfim, um miminho? E o seu grande argumento é sempre o mesmo, “sim, é uma casa realmente muito boa, tem tudo, mas não é a minha casinha”.

Ou seja, para quem já tem uma certa idade, uma casa não é apenas uma construção e o seu recheio, tudo isso substituível. É, sim, o local onde passaram uma boa parte da sua vida – ou até toda, em vários casos – e onde cada recanto, cada racha, cada mancha, está associado a uma ou várias recordações. Ou seja, não estamos a falar de uma casa mas sim de um lar, em que ser bom ou mau em termos materiais não é o que mais conta. E isso é impossível de reconstruir.

Junte-se a isso o facto de ficarmos menos abertos a mudanças à medida que vamos para novos e temos, de facto, uma tragédia que se soma, pesadamente, à da perda da casa.

Mas há mais. Gerações mais novas têm tudo e mais alguma coisa no telemóvel, no computador, na nuvem. Ou seja, se perderam fotos, por exemplo, podem recuperá-las muito facilmente. Mas para pessoas de uma certa idade, sobretudo em meios rurais, isso é uma “modernice” que lhes passa ao lado. Mais ainda, mesmo que tenham aderido às novas tecnologias no que diz respeito à atualidade, há todo um acervo, pequeno ou grande, de fotos de família e de objetos que, uma vez perdidos, desaparecem para sempre.

E, infelizmente, para muitos dos que estão bem avançados na ida para novos o passado tem um peso importantíssimo nas suas vidas, na ideia que fazem de si mesmos. Desaparecidos os testemunhos desse passado, é como se perdessem uma boa parte de quem são. É que não nos esqueçamos que muitos dos nossos idosos vivem totalmente, ou quase, no passado, algo que tem estado a mudar noutros países e até no nosso à medida que muda o modo como se vê a terceira idade, a nossa e a dos outros.

Gostaria, pois, que houvesse apoio psicológico fornecido pelo Estado virado para esta vertente da tragédia dos incêndios. Não digo que pessoas mais novas não precisem dele, sobretudo as que perderam amigos e familiares, mas os mais idosos necessitam de algo um pouco diferente, na minha opinião, claro. E, muito francamente, nunca ouvi falar destas tragédias sob esta vertente. Duvido, até, que haja técnicos habilitados nesta área.

Mas para quem vive em áreas afetadas frequentemente por grandes incêndios florestais, recomendo a (re)leitura da parte final do meu post Organizemo-nos. Falo, ali, em ter à mão um saco para emergências, com cópias dos documentos mais importantes, medicamentos, lista de medicamentos e, caso as tenha, cópias em suporte digital de fotos que considere importantes.

Mas aqui irei mais longe. Como às vezes há um bocadinho de tempo antes de se ter mesmo de abandonar a casa, que tal preparar uma lista prévia das tais coisas que são insubstituíveis para si? Álbuns de fotos, por exemplo, alguns objetos com ligações sentimentais, aquela colcha de renda feita pela mãe ou avó, enfim, o tipo de itens que, uma vez perdidas, desaparecem mesmo para sempre.

Assim, se houver uma ordem de evacuação, pode rapidamente meter essas coisas num saco ou mala para as tentar salvar. Pequena dica: como poderá não ser fácil levar algo consigo caso a evacuação seja em cima do acontecimento, seja criterioso na escolha. Roupa, por exemplo, pode sempre ser substituída – a menos que seja uma peça de grande estimação. Mas algo com muitos anos, herdado de um familiar, bom, será definitivamente um candidato à retirada.

Ou seja, analise com calma os seus bens e decida, atempadamente quais são aqueles de que sentiria imensa falta, mesmo que tivesse todo o dinheiro do mundo para os substituir. Pode, até, fazer “exercícios” de evacuação para ver qual a melhor maneira de os embalar...

Para a semana: Regresso às aulas. Sim, não são as crianças e adolescentes...